86

Em todas as temporadas há uma adaptação de Light Novel que é vendida como diferente das anteriores, mas termina sendo igualzinha a todas as outras. Infelizmente, nessa categoria de adaptação o sucesso acontece uma vez a cada cinco anos, ou mais. Gostaria muito que esse não fosse o caso,  visto que as LNs conquistaram uma fatia enorme do mercado de animes, inclusive os recursos de produção.

86° é um distrito da República de San Magnolia e se aplica à unidade militar homônima de humanos descartados na guerra contra o Império Giadian. Apesar da propaganda nacional em outros distritos garantir ao público que a guerra é sem derramamento de sangue através de drones, os 86 são de carne e osso, e acima de tudo estão morrendo por uma nação que não sabe de sua existência.

86 em vários momentos é demasiado expositivo. Em dado momento, Lena posiciona-se a frente de um turma e palestra lhes palestra (e a nós também) porque as pessoas com cabelo de core diferente de branco deveriam ser tratadas com respeito. Naturalmente, a ficção possui muitas alegorias para o racismo, e embora 86 não seja muito sutil a esse respeito, há pelo menos uma tentativa de nuance. O problema nisso é que o autor gasta quase toda a mitologia em torno dos cabelos marrom em alguns minutos. Como uma pessoa (de cabelo) branca, Lena tenta desempenhar o papel de uma salvadora (de cabelo) branca, mas sua primeira aparição a vê firmemente repreendida por sua equipe inicial. O que está faltando é a confiança - e como o dia a dia de Lena é mais sobre bolinhos de creme do que sobrevivência, será uma batalha difícil estabelecer isso.

Lamentavelmente, não consigo mais manter qualquer fascinação mórbida, tal qual tive por Mushoku Tensei (dropei). O problema do roteiro é que a distinção moral é martelada com insistência de preto e branco, não havendo espaço para o público tentar descobrir as coisas. A liderança militar é tão caricaturamente malvada que não consegui levar a história a sério, embora eu não pense que era para ser. É imediatamente claro que o que está acontecendo aqui (pessoas sendo usadas como soldados descartáveis e tratadas como não-humanos pelo estado) sim, é ruim.  Contudo, não é interessante quando a história nos diz especificamente como devemos nos sentir sobre isso. Apesar  de todos os erros, a  quarta temporada de attack on titan nos fez pensar sobre conceitos de bem ou mal de forma muito mais orgânica, por exemplo. Em 86 o espectador não tem escolhas, mistérios ou conflitos.

Não fique confuso, 86 vai se sair muito bem comercialmente e fico feliz por isso. Prefiro ver uma série como esta ter sucesso do que algumas das LNs realmente repugnantes que estão por ai, já que pelo menos é relativamente digno e parece estar defendendo um ponto de vista um tanto humanístico. Mas isso é tudo para mim. Haverá muitas pessoas falando sobre 86, todavia não serei uma delas.

Nota: ★ ★ ★ ½